© Cátia Pinheiro

CÁTIA PINHEIRO – The Walk #2

CRIADO EM RESIDÊNCIA - Loulé & Lagos 2018

Espaço Público Loulé
Ponto de Partida Convento do Espírito Santo *
Sáb 19 OUT / Dom 20 OUT - 15h00

Espaço Público Lagos
Ponto de Partida Messe Militar de Lagos *
Sex 1 NOV / Sáb 2 NOV - 15h00

* Início do percurso com intervalo de 4 Minutos entre cada espectador / Saídas individuais das 15h00 às 16h55.
Versão disponível em PT e EN / Limitado a 30 pessoas.

AUDIOWALK / 40' / M12 / 5€** - COMPRAR LOULÉ / COMPRAR LAGOS
** Em Loulé o bilhete para o espectáculo deverá ser adquirido na bilheteira do Cine-Teatro Louletano, em Lagos na bilheteira do Centro Cultural de Lagos.

The Walk #2 é um percurso áudio site-specific que se serve de uma cidade e das suas pequenas ficções. Exploram-se fronteiras entre interior e exterior, público e privado, ficção e realidade.
Nos percursos feitos especificamente para o Verão Azul, parte-se da relação entre urbanismo e natureza para propor uma reflexão acerca do conceito de Antropoceno. À medida que a humanidade reformula a paisagem, esquece o que ficou para trás, sem ter consciência de que esse passado que foi esquecido nos assombra. Qual é o grau de formatação cosmopolita que existe em cada um de nós? Será que nos recordamos da inexistência do Shopping A, B ou C ou parece-nos que sempre ali estiveram?
E se por uns momentos os nossos olhos pousarem de uma outra forma sobre as pedras, as plantas, as árvores, o céu e as outras espécies que nos rodeiam? E se em vez de habitarmos um espaço como habitualmente, abrandarmos o passo e permitirmos que seja o espaço que nos habite?


Criação e Locução: Cátia Pinheiro
Texto: Cátia Pinheiro e José Nunes
Sonoplastia e Edição Áudio: Vasco Rodrigues e Cátia Pinheiro
Produção Executiva: Ana Lopes
Produção: Estrutura
Apoio: República Portuguesa – Cultura / Direcção Geral das Artes
Gravação de excerto de ensaio gentilmente cedido pela Sociedade Filarmónica Artistas de Minerva

Cátia Pinheiro nasceu no Porto em 1980. Trabalhou como actriz com António Fonseca, Nuno Cardoso, Nuno Carinhas, Ana Luísa Guimarães, Nuno M. Cardoso, Mundo Perfeito, Philippe Quesne, Cão Solteiro, entre outros.
Co-criou e interpretou os espectáculos Receita para me Ouvires (2006), A Festa (2008), Geopolítica do Caos (2009), WTF? (2010), Wanted (2015), Uma Gaivota (2016), Geocide (2017), The End (2017) M’18 (2018) e PATHOS (2019) e os projectos transdisciplinares The Walk (2013/2014) e Display (2014).
É co-directora artística da Estrutura, que fundou em 2009 com José Nunes.

A Estrutura é uma companhia residente no Teatro Campo Alegre, no âmbito do programa Campo Aberto do Teatro Municipal do Porto
Foi fundada em 2009 por Cátia Pinheiro e José Nunes e tem desenvolvido a criação e produção de projectos de teatro e transdisciplinares e actividades de programação e formação que dialogam com a realidade do pensamento contemporâneo, promovendo a experimentação artística e a lógica colaborativa.
Tem colaborado com instituições como o Teatro Municipal do Porto, Teatro Nacional de São João, Teatro Nacional D. Maria, São Luiz Teatro Municipal, Centro Cultural Vila Flor, 23 Milhas, FITEI, Festival Temps d’Images, entre outros.


Grupo de Crítica VA9 – Áudio & Textos

Conversa 21 OUT 2019 – Teatro das Figuras, Faro

Sobre The Walk #2 / Loulé de Cátia Pinheiro
Texto de Soraya Ferreira Alves

Caminhar e olhar. Olhar com olhos de ver. Ver e imaginar, pensar, refletir. Isso é o que nos propõe Cátia Pinheiro em seu The Walk #2. Com grandes fones de ouvido, somos convidados a acompanhar seus passos e passear por Loulé. Pessoas nas ruas nos observam curiosas, pois não há como não rir, assentir com a cabeça, parar e respirar fundo, olhar para os arredores (ou mesmo responder em voz alta “SIM!”), ao comando da artista. A imersão é profunda. Ela nos fala diretamente e obedecemos prontamente. Os efeitos sonoros ampliam as sensações. Ouvimos os passos que devemos acompanhar, pássaros, carros, vozes. Ao passar por uma rua de comércio, que no dia da gravação do áudio estaria movimentada, diferentes vozes, ruídos. Mas num sábado chuvoso e frio, na rua vazia, no passeio solitário, a realidade era outra. Sons de carro passando pelas ruas. “Preste atenção ao atravessar!” Mas ao olhar, onde estão eles? A magia da arte transporta para um outro tempo e espaço. Ao estabelecer uma relação entre passado, presente e futuro, Cátia chama atenção para as construções antigas e o entorno atual. Pergunta, ao chegarmos no castelo: “Será que aqueles que o construíram pensaram o que um dia poderia haver ao seu redor?” Bem, talvez eles não, mas nós, hoje, podemos fazer previsões sobre o que poderá acontecer num futuro próximo, se não cuidarmos do nosso planeta. Do alto da torre do castelo, somos intimados a olhar para o mar e pensar se um dia, não muito longínquo, suas águas não cobrirão tudo o que vemos.
Precisamos refletir sobre como estamos utilizando os recursos naturais, sobre as transformações que estamos provocando. Não se deixe enganar pela gentileza de ser presenteado com uma dose de licor de figo no Café Calcinha, pois enquanto saboreamos a bebida, logo vem a pergunta: “Pensamos de onde vem o que consumimos?” A caminhada segue e, a todo o instante, as lembranças da atriz se confundem com as nossas. As experiências e conhecimento de mundo de cada um são evocados. Convívio de muitos tempos e histórias. Sentimentos partilhados. Uma sensação de já conhecermos aquela que nos fala. Ao retornar e devolver os fones, partilhei minha experiência com uma mulher que esperava no Convento do Espírito Santo. Enquanto me ouvia, revelou ser Cátia. Abracei-a, emocionada, como a uma amiga.
1 de Novembro 2019

Sobre The Walk #2 / Lagos de Cátia Pinheiro
Olhar não fere a paisagem – Texto de Alexandre Valinho Gigas

Rumei ao Sul para encontrar Sol. Em Lagos apanho o que resta do Festival Verão Azul. Ainda venho a tempo. A Cátia Pinheiro propõe-me um percurso audio para o qual já não vou em modo tabula rasa. Há um ano ouvi-a a apresentar o projeto. Sei do que se trata; uma leitura da paisagem pelos seus olhos, com a sua voz que nos conduz os passos; os seus passos ecoantes, o respirar dessa paisagem há um ano gravada, misturando o Passado, o Presente e o Futuro. Gosto de jogar à fenomenologia da paisagem desde que fiz uma tese sobre isso, sobretudo quando se acrescenta o olhar de outros olhos, que me mostram o que me escapa. Escapa-nos sempre algo. Deixo-me ir. Afinal, também aqui em Lagos disponho o Passado, o Presente e o Futuro no meio do tabuleiro paisagístico. As memórias tendem para a ironia e, logo na primeira paragem que me propõe a Cátia, encontro a história de dois amantes Futuros, num Passado distante, que numa pequena praia inventaram um desencontro. Em comum partilhavam o sal do mar nas roupas molhadas e o frio da madrugada. Fizeram um longo percurso para casa, com o silêncio dos passos a ecoar nas perguntas de cada um. O mar enrodilha-se caprichoso ali onde as ruínas se vão desgastando. Ainda vou à poesia, de nesse promontório ter um dia pensado com muito carinho na quantidade de amigos que se haviam perdido nos labirintos crus da Heroína e a luz do sol poente me guiava no exercício de olhar sem ferir. Desperto. A Cátia conduz-me a outras questões. A paisagem ferida, talvez pela falta de tempo do nosso olhar pausado. Estamos todos a falar a mesma linguagem; eu, ela e a paisagem com cada um dos seus elementos. Temos a memória de alguns elementos históricos que todos conhecem e talvez retirássemos várias camadas de betão na diacronia dos verdes fustigados, lá ao longe. Algo que sublinha a aura dourada dos penhascos como um Glenn Gould em infinitas variações de Goldberg. Ah! Pois é. Há música nesta dramaturgia de uma leitura que me oferecem; vozes de um passado; ecos de muitos passos, até dos passos dos que passam anónimos na História. É tudo um deleite, uma trip cinestésica perante os elementos; as cores que se tornam sons; as ruínas que se transformam em sonhos sobre o Futuro; tudo sem nada mais que os sentidos, despertos para a coragem da pergunta que a cada passo a paisagem faz ecoar dentro de nós.
7 de Novembro 2019